A floresta amazônica chegou ao ano de 2020 marcada pela tragédia. Desde o malfadado "dia do fogo" (10 de agosto de 2019), apresentado de forma bizarra como manifestação de apoio a um presidente descompromissado com a preservação desse bioma, milhares de hectares de mata queimaram continuamente, dia após dia. As consequências ainda estão se fazendo sentir. As perdas em biodiversidade são difíceis de calcular, mas certamente afetam os ecossistemas e os meios de vida das populações rurais e ribeirinhas. Os impactos sociais e ambientais são denunciados diuturnamente em todo o mundo, de maneira inútil. A sociedade brasileira manteve-se (não apenas sobre esse tema) estranhamente impassível, ainda confusa e dividida desde a última campanha eleitoral dominada por desinformação e irracionalidade. Já a opinião pública internacional, movida pelo volume de informações que circulou nos veículos de notícias e nas redes sociais, pressionou seus governos a tratarem o Brasil com desconfiança. A Amazônia é um desses casos emblemáticos de recrudescimento de uma construção ideológica sobre a primazia de desenvolvimento e a exploração de recursos. Das autoridades públicas e religiosas dos séculos XVI e XVII, passando pelos naturalistas dos séculos XVIII e XIX, chegando aos documentos e aos estudos produzidos no século XX. Impressiona a recorrência da visão edênica sobre a floresta, as impressões sobre o exotismo dos povos indígenas contatados, sobre a exuberância da fauna e da flora. Esse olhar "de fora", que não raro se estende sobre todos os que habitam esses espaços, é um dos pontos centrais desse entendimento exógeno e relacionado ao pensamento político-econômico dominante. Esta obra pretende refletir sobre tendências e legados do passado, examinando diversos aspectos da Amazônia: históricos, antropológicos, sociológicos, legais, culturais, ambientais e geográficos. O conjunto de especialistas acadêmicos aqui reunidos, muitos dos quais moram e trabalham nos estados amazônicos, propôs-se a olhar para esses aspectos e, trazendo-os em seus textos, proporcionar uma aproximação entre esse mundo diverso e os leitores do presente livro. Sua justificativa decorre da necessidade de avaliar alguns paradigmas e discrepâncias que persistem, mesmo após longas décadas de estudos e divulgação de informações. Resistem mesmo ao encurtamento das distâncias, característica do século XXI.